Cheguei às últimas páginas de uma bela lição de jornalismo e competência profissional: “101 dias em Bagdá”, da igualmente bela jornalista norueguesa Asne Seierstad (foto), conhecida também por escrever “O livreiro de Cabul”. Nele, a repórter narra as agruras e os obstáculos de contar a história de iraquianos que, após anos de uma ditadura implacável, se vêem à frente de bombas e estilhaços que irrompem janelas e portas matando família inteiras, ao mesmo tempo em que tentam tocar a vida como se nada estivesse acontecendo. Até mesmo para uma jornalista escandinava vinda de um país frio em que nada parece acontecer - mas que possui um vasto currículo de cobertura de outras guerras - aquele cenário é brutal. Ela chora, pelo menos umas duas vezes até agora.
Paralelo ao produto de seu trabalho, ela descreve os desdobramentos e os obstáculos que precisa superar quase diariamente apenas para poder mandar seus artigos aos jornais para os quais trabalha, os boletins para rádios européias e canadenses, as entradas ao vivo para televisões de um punhado de países... ufa!
Foi neste capítulo que eu fiquei com vergonha.
“101 dias em Bagdá” é uma leitura envolvente e que flui graças à tensão da narrativa e ao seu conteúdo histórico. São histórias de Mohameds e Fátimas que a televisão não mostrou, e nem poderia. Provavelmente também choraríamos.
Em tempo: não sei se compraria esse livro, mas gratamente caiu-me às mãos como cortesia após ter a oportunidade de conhecer pessoalmente a própria Asne. Em uma concorrida coletiva em uma tarde quente de Porto Alegre, tive a oportunidade de fazer a primeira pergunta a ela – uma norueguesa que só conhecia até então pelo nome na capa de “O Livreiro de Cabul”.
- Das coberturas que você vez até hoje, qual foi a mais difícil e por que?
(Como jornalista, sempre fico curioso em saber os obstáculos das matérias mais difíceis e como se sair delas)
- Humm... I don’t know. (Pensativa). Esta é uma resposta difícil. Acho que o Iraque, por causa das circunstâncias.
Um bom motivo para não perder “101 dias em Bagdá”.